quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

A Caminho do Fim

Por Tiago Amaral - Versão Revisada

Na penumbra de uma galeria antiga, fui atraído por um retrato que parecia pulsar com vida própria. A jovem ali, morta há séculos, tinha olhos que me prendiam — profundos, quase vivos, emoldurados por uma moldura de madeira gasta. Sua beleza era hipnótica, mas um frio inquietante rastejava por minha espinha. Quanto mais eu a contemplava, mais a angústia e a paixão se entrelaçavam em meu peito, como se o retrato sussurrasse segredos que minha alma temia ouvir.

De repente, o mundo ao redor escureceu. As luzes da cidade, os carros, as vozes dos transeuntes — tudo sumiu, engolido por uma escuridão densa. Um trovão rasgou o céu, e a galeria tornou-se uma ilha frágil entre vidros que tremiam. Meu coração batia como um tambor, a pele pálida, o estômago revirado por uma agonia que queimava de dentro para fora. “Maldita hora que vim a esta exposição”, pensei, as mãos trêmulas segurando o parapeito, como se os vidros fossem minha única proteção contra o abismo.

O mundo girava, a realidade dissolvendo-se num pesadelo. Pela vidraça, as pessoas na rua não eram mais humanas — seus rostos, caveiras descarnadas, marchavam em silêncio. Carruagens puxadas por cavalos de pelagem negra surgiram, o som de seus cascos ecoando como um presságio. No horizonte, guerreiros travavam batalhas sangrentas, o solo encharcado de vermelho. Olhei para o céu e vi anjos e demônios colidindo, suas asas cortando nuvens em chamas. “O que é isso?”, murmurei, o pavor me sufocando. A cidade ardia, sangue escorria pela vidraça, e as caveiras me encaravam. Meus joelhos cederam, e desmaiei, engolido pela escuridão.

Ao despertar, o rosto da jovem do retrato estava diante de mim, real, vivo, seus olhos me perfurando com a mesma intensidade. Confuso, com o coração ainda disparado, perguntei: — Onde estou? — Ela me fitou, serena, e respondeu com uma voz que ecoava como um oráculo: — Você está no fim dos tempos. E está aqui para lutar ao meu lado. Tome isso. — Em minhas mãos, ela colocou uma pistola, o metal frio pesando como um destino inevitável.

O mundo que eu conhecia havia desaparecido. À minha volta, apenas ruínas e o eco de uma guerra sem fim. A jovem, agora minha guia, permanecia ao meu lado. A luta, eu sabia, estava apenas começando.

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