No coração de um milharal, um espantalho erguia-se solitário, os braços abertos como quem recebe os corvos que ali pousavam ao entardecer. Diante dele, uma velha casa de madeira abrigava a família Morgue: Jack e Clara, pais de Keity, a filha adolescente; Erick, o primogênito; e July, a caçula.
A vida corria serena. De manhã, o sol entrava pelas janelas como um convidado pontual, aquecendo os quartos com luz dourada. O ar era fresco ao amanhecer, tornava-se quente durante o dia e voltava a refrescar à noite. Jack levantava cedo para cuidar da fazenda, quase sempre com a ajuda de Erick. Clara tomava conta da casa e da pequena July, enquanto Keity seguia sua rotina de estudante.
Numa noite tranquila, com a família reunida na sala, um estrondo sacudiu a casa inteira, como se o chão tivesse sido erguido e largado de volta. Pela janela, todos viram uma luz intensa, branca e ofuscante, que emitia um som agudo e fino, semelhante ao de um alfinete riscando vidro. Os vidros das janelas explodiram em estilhaços. Partículas luminosas, minúsculas como vaga-lumes, entraram dançando no ar.
Jack correu para pegar a espingarda. Clara o segurou pelo braço.
— Pode ser perigoso — sussurrou.
— Preciso ver o que está acontecendo — respondeu ele, firme.
Erick o acompanhou. No milharal, uma esfera luminosa pairava sobre as espigas, pulsando. Formas de luz subiam e desciam, como se dançassem em silêncio. July, assustada, perguntou à mãe:
— O que está acontecendo?
Clara a abraçou, sem tirar os olhos da janela. Keity, atraída por uma força invisível, caminhou até a porta e ficou parada, em transe, fitando a luz.
Jack e Erick avançaram pelo milharal com os dois cães. De repente, os animais recuaram, ganindo. Pai e filho sentiram a cabeça girar; alucinações os derrubaram entre as fileiras de milho. O sangue escorreu de seus narizes. Quando se recuperaram, estavam próximos da esfera. A luz era tão forte que ofuscava tudo ao redor. Formas humanoides, feitas de pura luminescência, moviam-se com graça alienígena.
Uma delas aproximou-se de Jack. Ele recuou, tropeçou e caiu, mas não desviou o olhar. A figura pairou por um instante e desapareceu. Um tremor violento sacudiu a terra. Um clarão absoluto engoliu o mundo. A cidade inteira apagou-se por um segundo — ou uma eternidade.
Quando a luz voltou, Jack e Erick acordaram em suas camas, ao lado de Clara, Keity e July. O clarão havia apagado suas consciências. Aos poucos, as lembranças voltavam: o estrondo, a luz, as formas, o sangue, o vazio.
A vida retomou seu curso. O sol continuou a visitar as janelas. O milharal cresceu. Mas, no centro da plantação, um sinal permanecia: um círculo perfeito de milho queimado, onde nada mais cresceria. Aquela noite nunca seria esquecida.
Nenhum comentário:
Postar um comentário