Por Tiago Amaral - versão
editada
Era uma figura estranha —
alta, de pele escura, pernas alongadas e dedos finos como raízes retorcidas.
Seus braços, desproporcionalmente longos, moviam-se com leveza, como se
pertencessem a um mundo em que o movimento obedecesse a outras leis. Imaginei que
vinha de um planeta denso de árvores gigantes, onde braços assim fossem uma
necessidade e não uma aberração.
Sua face era incomum, quase
assustadora — não por feiura, mas pela absoluta ausência de familiaridade.
Ainda assim, algo nela transmitia uma doçura inesperada. Por que, afinal, teria
me salvado? Eu, um ser miserável, insignificante diante da vastidão cósmica?
Apenas mais um homo sapiens, uma espécie falha, violenta e barulhenta, em um
universo repleto de consciências superiores.
Era um dia quente. O sol
queimava alto, e eu me refugiara na sombra de uma velha mangueira carregada de
frutos maduros. Subi em seus galhos grossos buscando brisa e doce. Não
esperava, é claro, o que viria a seguir.
A queda foi brusca. Um galho
seco, um passo em falso — e então, o chão. O impacto me deixou paralisado. Meus
membros, imóveis. Apenas meus olhos se mexiam. E foi ali, imobilizado na
poeira, que o vi.
A criatura estava logo abaixo
de mim. Alta como um poste, e seus olhos brilhavam com um dourado tênue, como
se condensassem a luz do próprio sol. E daquele brilho emanava... calor. Não
físico, mas espiritual. Era como ser tocado pela compaixão.
Olhei para cima, para os
galhos que haviam me sustentado. O céu permanecia azul, inalterado. O tempo
parecia parado. A criatura se aproximou em silêncio, e mesmo naquela situação,
eu não sentia medo. Ao contrário: sentia uma paz absurda, quase perturbadora.
Não havia ódio ali. Nem julgamento. Apenas... presença.
A criatura estendeu a mão —
longa, escura, luminosa. Toquei-a com os olhos, pois mais nada em mim se movia.
E então, um milagre sussurrou em meus ossos quebrados. Senti os nervos pulsarem
novamente. Os membros, antes inúteis, voltaram à vida. Era como mágica, ou
ciência avançada demais para eu compreender.
Atrás dele, no céu, surgiu
uma esfera luminosa. Um objeto voador silencioso, dourado por dentro. Pelas
janelas pequenas e arredondadas, vi sombras se moverem. Outros como ele.
Eu me levantei. Minhas
palavras vacilaram nos lábios. O que se diz a um ser assim? Que tipo de
gratidão basta? Ainda assim, murmurei:
— Obrigado.
Ele inclinou a cabeça. Seus
olhos, agora oscilando entre dourado e azul, brilharam suavemente. E ele
respondeu, em uma língua que tocou mais minha alma do que meus ouvidos:
— Shor da chi narratir
anunari.
Não entendi. Mas compreendi.
Era um adeus. Um voto. Ou talvez... uma promessa.
Ele colocou uma das mãos
sobre minha cabeça. Houve luz. Tanta luz que o mundo desapareceu por um
instante. Quando voltei a mim, ele caminhava em direção à esfera flutuante.
A nave ergueu-se, silenciosa,
até pairar sobre o milharal vizinho. Um feixe de luz desceu do casco e tocou o
campo. E então, com a velocidade dos deuses, sumiu no céu.
Ao caminhar até o milharal,
encontrei algo que jamais esquecerei: um símbolo, queimado no solo, vasto e
incompreensível — como um idioma escrito pelos próprios astros. E naquele
instante, soube. O que quer que fosse aquilo, significava:
“Voltaremos.”
Mas não seria uma simples
visita.